O Direito Previdenciário brasileiro, como um ramo especializado do Direito, regula a seguridade social, a qual compreende um sistema de benefícios e serviços que visam garantir proteção ao trabalhador e sua família contra riscos sociais como desemprego, invalidez, idade avançada e maternidade. Uma questão relevante e frequentemente debatida dentro deste campo é a legalidade do desconto de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade.
1. Conceito de Salário-Maternidade
O salário-maternidade é um benefício previdenciário pago à segurada do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) durante o período de afastamento do trabalho em virtude do nascimento de filho, adoção, guarda judicial para fins de adoção ou aborto não criminoso.
Este benefício substitui a remuneração da segurada durante o período de afastamento, que pode variar de 120 a 180 dias, conforme o empregador e as políticas internas adotadas.
2. Natureza Jurídica do Salário-Maternidade
Para entender a controvérsia sobre a contribuição previdenciária, é essencial discutir a natureza jurídica do salário-maternidade. Este benefício, ainda que pago pelo INSS, é uma substituição salarial temporária, tendo natureza salarial para efeitos previdenciários.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a legislação previdenciária consideram que durante o período de recebimento do salário-maternidade, a relação de emprego se mantém ativa, o que implica na continuidade de certos direitos e obrigações, incluindo a contribuição previdenciária.
3. Base Legal da Contribuição Previdenciária
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 195, estabelece que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das contribuições sociais.
A legislação específica que regulamenta as contribuições sociais é a Lei nº 8.212/1991 (Lei de Custeio da Previdência Social). Esta lei dispõe, em seu artigo 22, que a contribuição social do empregador incide sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados a qualquer título, durante o mês, ao segurado empregado.
Especificamente, o artigo 28, §9º, da Lei nº 8.212/1991, define o salário-maternidade como salário-de-contribuição, ou seja, ele integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias. Isso implica que tanto o empregador quanto a empregada devem contribuir para a Previdência Social durante o período de recebimento do salário-maternidade.
4. Jurisprudência e Entendimento dos Tribunais
Os tribunais superiores brasileiros, como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), têm se debruçado sobre a legalidade da incidência da contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade.
Em decisão recente, o STF, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 576.967, com repercussão geral reconhecida, firmou a tese de que é inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade.
O argumento central é que essa contribuição onera a empresa de forma indevida e que o salário-maternidade tem caráter de benefício previdenciário, não devendo ser tratado como contraprestação de trabalho.
Essa decisão do STF, ao reconhecer a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, reformulou a interpretação até então dominante, que seguia a orientação da Lei nº 8.212/1991.
A Corte entendeu que essa incidência violava o princípio da igualdade e da proteção à maternidade, previsto no artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal, que garante à mulher o direito à licença-maternidade sem prejuízo do emprego e do salário.
5. Efeitos Práticos da Decisão do STF
Com a decisão do STF, o entendimento atual é que não deve haver a cobrança de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade. Isso gera efeitos práticos importantes tanto para empregadores quanto para empregadas:
- Empregadores: Não são mais obrigados a recolher a contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de salário-maternidade. Isso representa uma redução nos custos de folha de pagamento e na carga tributária.
- Empregadas: Não têm mais a contribuição previdenciária descontada sobre o salário-maternidade. Isso pode resultar em um valor líquido maior recebido durante o período de licença.
6. Implicações Fiscais e Econômicas
Embora a decisão do STF beneficie diretamente empregadores e empregadas, ela também levanta questões sobre o financiamento da Previdência Social. A redução na arrecadação decorrente da exclusão do salário-maternidade da base de cálculo da contribuição previdenciária implica na necessidade de buscar fontes alternativas de financiamento para assegurar a sustentabilidade do sistema previdenciário.
A decisão judicial também pode provocar um ajuste nas políticas públicas e nas regulamentações administrativas para alinhar a legislação infraconstitucional ao entendimento do STF, promovendo uma revisão nas bases de cálculo das contribuições sociais e ajustando mecanismos de compensação para não prejudicar o equilíbrio atuarial da Previdência Social.
Conclusão
A legalidade do desconto de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, à luz da recente decisão do STF, foi declarada inconstitucional. Esta decisão representa uma importante mudança no entendimento jurídico e prático, refletindo uma proteção maior à maternidade e um ajuste nas responsabilidades financeiras das empresas.
Contudo, exige também um planejamento cuidadoso e uma adaptação por parte do sistema previdenciário para garantir a continuidade da proteção social oferecida aos trabalhadores.
O Direito Previdenciário, assim, continua a evoluir, adaptando-se às demandas sociais e às interpretações judiciais para melhor atender às necessidades dos segurados.
Procure sempre um advogado.